sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

SALINGER


A morte de J.D. Salinger, na semana passada, fez retornar uma reflexão sobre o mundo das celebridades. Seu maior sucesso,O Apanhador no Campo de Centeio (The Catcher in the Rye, 1951), o levou ao patamar dos autores míticos que se tornam célebres por causa de uma única obra, apesar de ter escrito textos muito bons, que acabaram por ser eclipsados pela história de Holden Caulfield, um símbolo da geração de jovens do pós-guerra, os baby-boomers que desaguaram na plena eferversência sócio-cultural dos anos 60. Não importa se Mark Chapman, o assassino de John Lennon, tivesse pedido ao ex-Beatle que autografasse uma cópia do livro, pouco antes de cravar cinco balaços no ídolo. Esta triste correlação não diminui o valor literário de The Catcher in the Rye.
Jerome David Salinger sempre foi uma figura estranha. Um recluso nato, com um pé – talvez os dois – na paranóia. Ainda na época do lançamento de The Catcher in the Rye, na década de quarenta, fez o seu editor prometer que não lhe enviaria quaisquer críticas que fossem publicadas sobre o livro. Reclamou também que a sua foto na contra-capa estaria muito grande. Solicitou que não fosse feita qualquer publicidade do livro aludindo à sua pessoa, alegando que não queria correr o risco de acreditar no que leria.
The Catcher in the Rye conta, numa narrativa em primeira pessoa, alguns dias na vida do adolescente Holden Caulfield, que acaba de ser expulso da sua terceira escola bem às vésperas do natal, nos EUA do pós-guerra. Salinger usa uma linguagem simultaneamente criativa e coloquial (o que dificulta a vida dos tradutores) e, assim, vai deslindando os passado do personagem, invariavelmente envolvido em situações problemáticas que, antes de levá-lo a uma previsível conclusão politicamente correta, o estimula a continuar encontrando razões para viver em consonância com seus dilemas.
O texto segue a linha joyceana do fluxo de consciência, com as frases jorrando aos borbotões como se saídas diretamente da cabeça do narrador, saltando de um assunto para o outro sem grande cerimônia, parecendo obra do acaso. Este stream of consciousness se presta bem para demonstrar a flébil estabilidade emocional do protagonista e não raro, cutucar com a pena curta as certezas absurdas que nós, leitores, porventura tenhamos.
Há, em Caulfield, um universo duplo que instiga o leitor a procurar motivos para suas atitudes imprevistas. É como se ele representasse o limiar da perda da inocência, a cada encontro, diante de todas as expectativas. Como se penetrasse numa selva hostil, Caulfield se choca com a falsidade que perpassa as relações humanas, mas continua a inventar seu próprio caminho, com ironia e humor, o que torna a narrativa mais estimulante.
Li e reli o livro em várias fases de minha vida e sempre encontrei alguma coisa nova nesta história ao mesmo tempo simples e complexa. No entanto, um pensamente cruzava minha mente: por que Salinger se retirou do mundo dos holofotes e não usufruiu da fama e da popularidade de seu livro? Pois bem, a resposta está num dos capítulos finais de sua obra, escondidinha e discreta, sutil como um raio de sol que, subitamente, revela em algum lugar um objeto há muito procurado, mas nunca encontrado. Jerry sabia que o livro deve ser sempre muito maior e muito mais importante do que aquele que o escreveu.

100226
Fernando

Um comentário:

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